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Como a literatura indianista de José de Alencar diz muito sobre nós até hoje

Foto do escritor: Pró-EstudarPró-Estudar

Por que hoje o indígena é invisível para a sociedade brasileira?


A situação do indígena no Brasil é, atualmente, de invisibilidade e de exclusão. Durante os três séculos de exploração e colonização do país, entre o momento em que Pedro Álvares Cabral e sua tripulação desembarcaram no litoral brasileiro, em 1500, até a proclamação da Independência, em 1822, os indígenas foram escravizados, explorados e, acima de tudo, catequizados. Esse tratamento com os índios não mudou com a Independência do país, com a proclamação da República que viria a seguir e, muito menos, com o Regime Militar ou a redemocratização; pelo contrário, esse tratamento tem sido cada vez mais encoberto e cuidadoso, para que organizações que protegem essa população — que foram criadas ao longo de séculos de abusos — não tivessem conhecimento desses atos.


Tendo em vista essa questão e a situação precária desses povos, quando entramos em contato com a literatura romântica brasileira nos deparamos com uma premissa: trazer reconhecimento da cultura brasileira. A literatura romântica, em crescimento no século XIX no Brasil, chega com ideais nunca antes vistos no nosso país: de criar uma cultura inteiramente brasileira, de deixar as marcas europeias e portuguesas de lado, ideais marcados por todo o sentimento vindo da Independência do Brasil, por toda a idealização dessa realização e pela “lenda” do grito de “Independência ou morte!” de D. Pedro. Com esse crescente, surge, então, a literatura indianista.

José de Alencar

José de Alencar foi o grande nome da literatura indianista: o autor fez uma trilogia, baseada inteiramente no ideal do índio como herói nacional. Mas, por que o índio, afinal? Alencar poderia ter escolhido o negro, o próprio português, que eram uma das grandes partes da população que habitava as terras brasileiras. Entretanto, apesar do crescente sentimento abolicionista da época, Alencar era escravagista e não poderia de forma alguma escolher o negro como um exemplo do que era o brasileiro; sobrava assim, o branco europeu — que não podia ser escolhido pelas tentativas de fugir da imagem europeia — e o índio.


Assim, o romancista desenvolveu sua trilogia com os livros Ubirajara, O Guarani e Iracema, todos protagonizados por indígenas que, respectivamente, narram o primeiro contato com o português, o índio se acostumando ao português e, por fim, a união total entre o índio e o branco. Quando observamos a fundo essa idealização, ela se mostra agradável e até bonita, mas, afinal, se o índio de 1860 era tão importante para a construção nacional, porque hoje ele é excluído?


Fácil: porque o índio de Alencar e o índio do indianismo não é índio! Chamamos isso de “mito sacrificial”: Alencar vai enxergar em suas obras não “uma só população” como promete o nacionalismo, mas um colonizador e um colonizado — que se entrega em prol do nascimento da nação —, que não é nada mais que um selvagem que o português soube domesticar. A obra de Alencar mistura vocábulos do português às línguas indígenas, dizendo que essa é uma língua falada no Brasil naquele momento, sendo que não era.


O mito sacrificial em si não passa de uma crença de que o indígena faz uma “imolação voluntária”, como se ele mesmo quisesse se entregar ao português. Para exemplificar, podemos usar da terceira e última obra de Alencar, Iracema, em que a relação com o português já está encaminhada. O primeiro elemento que constitui esse mito em Iracema, é o pensamento conservador: Alencar mostra personagens como Poti, um indígena, abrindo mão de seu nome, para receber um novo nome — e ele se orgulha! — , como se o índio da época quisesse ser português. O segundo é o mito indianista: em Iracema, cria-se um ar mítico de que essa foi a formação do Ceará, mostrando o filho de Iracema, Moacir, como o primeiro cearense, como se Iracema tivesse sido predestinada a isso e somente a isso. Por fim, há a metáfora romântica, a idealização de Iracema — a “virgem dos lábios de mel”, sendo que a virgindade é um tabu na Europa, não na América indígena — , a personagem é tratada de forma hiperbólica e sempre adequada aos gostos europeus.


É assim que nos fica clara a importância da literatura na representação da nossa sociedade, não apenas através do que encontramos nas linhas dos livros e na história, mas o que está nas entrelinhas, o que José de Alencar e tantos outros escritores indianistas mostraram sobre seus verdadeiros pensamentos sobre o índio: que ele é um selvagem a ser domesticado pelo branco, etnia que eles consideram superior.


Escritor por Thayssa Seyli Sandrini Soares (grupo de Literatura)

 

Referência:

BOSI, A. Dialética da colonização. 1ª ed. São Paulo: Schwarcz, 1996.

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